Como se sentir seguro para tomar decisões no meio de tanta informação.
Na semana passada, fui participar de um capacitação em Maceió e peguei um Uber para voltar para casa. Eram 9h da manhã e o trânsito estava intenso na Av. Almirante Álvaro Calheiros (mas a praia do lado de fora do carro estava linda de morrer!). O motorista e eu começamos a conversar sobre saúde e chegamos ao tema mais discutido a três anos atrás, a declaração da OMS sobre o consumo de bacon e carnes processadas.
Ele comentou como ficava confuso quando lia algo do tipo, já que "uma hora eles dizem que faz bem, depois dizem que faz mal. Como eu vou saber qual dos dois é certo? Em quem eu posso confiar?". Nós acabamos engatando uma conversa sobre essa insegurança dele (e de todos nós) e sobre como "é chato viver a vida com medo de tudo".
Antes de continuar, vamos deixar claro: é normal, muito normal, sentir medo. Aliás, o medo é saudável. Assim como todas as emoções, ele tem uma energia própria (é diferente sentir medo e sentir tristeza, certo?) e essa energia ajuda a preservar nossa vida.
A região do cérebro humano que ativa o alerta de medo faz parte do sistema límbico, e funciona como um scanner que compara cada informação nova com nossas experiências anteriores (e a de nossos antepassados) para decidir qual reação é a mais adequada para cada momento.
Como assim?
Você está andando na rua (ou na praia, vai, já que a história começa em Maceió) e vê um cachorro vindo em sua direção. O seu sentido da visão capta a imagem e manda para o sistema límbico no cérebro, que escaneia todas as memórias que você tem sobre suas interações com cachorros e outros animais, como a sua família reage na frente de um cachorro etc, e então envia uma mensagem de perigo ou segurança (ou algo entre esses dois) para o sistema nervoso.
Mas se você nunca viu um cachorro na sua frente, o cérebro ainda assim terá as outras referências (as histórias que você ouviu sobre cachorros, seu nível de estresse naquele dia, a confiança na sua capacidade de se proteger e cuidar de si mesmo) para saber se vai reagir com medo ou não àquele estímulo desconhecido.
A questão é que hoje em dia nosso sistema límbico está sobrecarregado de referências de medo. Na verdade, estamos sobrecarregados, ponto. São tantas, TANTAS informações disponíveis sobre todos os temas possíveis e imagináveis, que nosso processo de curadoria já não funciona tão bem. E como não temos o costume de parar pelo menos uma vez ao dia para respirar e esvaziar a cabeça, as informações continuam se acumulando.
Você tem medo de quê?
O diálogo com o motorista do Uber me fez lembrar de um depoimento que eu vi no documentário Troque a Faca pelo Garfo (Forks Over Knives). Uma das entrevistadas, uma mulher que reverteu sua diabetes e hipertensão sem o uso de medicamentos, apenas seguindo a orientação de um nutricionista de mudar sua alimentação para uma dieta vegana, relata que seu médico, ao ver os resultados promissores do exame de diabetes, comentou "Mas o que pretende esse nutricionista? Fazer você parar de tomar remédios?". Também lembrei de quando minha dermatologista me orientou a usar protetor solar até dentro das quatro paredes de meu apartamento.
Eu sinto que estamos vivendo uma paranóia coletiva, desconfiando do sol, do ar, da comida, dos "germes e bactérias". A sensação de insegurança do motorista é mais do que justificada. Cada dia recebemos uma informação nova sobre o mesmo tema (uma taça de vinho todas as noites faz bem ou mal, mesmo?) e o nosso sistema límbico está lá, trabalhando 24h por dia, 7 dias por semana, recolhendo e guardando tudo o que ouvimos, lemos, aprendemos. E no meio desse mar de dados, a mente começa a se questionar. Será que a pesquisa é comprada? Será que este meio de comunicação é idôneo? O que será que meu médico pensa sobre isso?
Chegar a essas respostas é simples. Você só precisa fazer o seguinte: respire fundo, deixe de pensar conscientemente nas informações que você já recebeu sobre o assunto (não se preocupe, elas já estão registradas no seu cérebro), pense no seu prato de bacon (ou no protetor solar, ou na nova proposta de emprego) e confie na resposta que vier. Confie! Você sabe melhor do que ninguém o que é bom ou ruim para você. Se você percebe que não tem mais tido vontade de tomar suco de laranja de manhã, confie! Pode ser que a acidez da laranja esteja afetando seu sistema digestório. Fica olhando as propagandas de estúdios de dança do ventre e sente uma vontade estranha de se matricular? Pode ser que o seu corpo esteja precisando daqueles movimentos para estimular suas glândulas endócrinas.
Nós passamos anos e anos recebendo educação formal para aprender a analisar dados racionais, mas não somos treinados na análise de dados sensoriais.
Ficamos desconectados dos sinais que recebemos o tempo todo do corpo e acabamos delegando aos outros (jornais, médicos, amigos) a responsabilidade de nos dizer o que é bom ou ruim para nós. Mas as informações que recebemos dessas fontes são só uma parte do todo, estão incompletas, cheias de falhas e interferências. É assim mesmo! O médico de alguns parágrafos acima estava tão convencido de que diabetes só se trata com remédio que não conseguiu nem perceber o movimento incrível de cura que o corpo humano da sua paciente estava realizando bem diante de seus olhos.
Então eu insisto: comece olhando para as referências de medo e cautela que você vem seguindo para saber se elas têm mesmo algum apoio na sua realidade. Ajude o seu sistema límbico a criar as suas referências. Ouça as opiniões das pessoas nas quais você confia, leia tudo o que achar necessário sobre qualquer assunto, e depois siga a sua própria voz. No final das contas, as nossas escolhas não devem ser feitas pensando no certo ou errado. Esses conceitos são relativos demais. O que é certo para um é errado para outro. As escolhas maduras e autônomas são apenas coerentes com a pessoa que você é. Portanto, confie!
Vejo vocês por ai! ;)
0 Comentar